Remake de “Renascer” prova que nostalgia não é garantia de sucesso

Recontar um clássico, mesmo com atualizações, nem sempre é uma boa escolha

Pablo Brito

Três personagens da novela Renascer olhando para a camêra, uma mulher no centro e dois homens ao seu lado
A nova versão de Renascer foi exibida entre janeiro e setembro deste ano. (Foto: Divulgação, TV Globo)

“Nada cai do céu, nem cairá.” Esses eram os versos que Ivan Lins cantava no início da abertura da versão original de Renascer, em 1993. Palavras que a Globo deveria ter prestado mais atenção. Desde que a emissora anunciou, no final de 2023, o remake da novela — 30 anos após sua estreia —, muitos enxergaram a decisão como uma aposta fácil e pouco criativa para garantir mais um sucesso no horário nobre das 21h.

Impulsionada pelo fenômeno que foi o remake de Pantanal em 2022 e a terceira reprise de O Rei do Gado, a Globo acreditou que o interesse pelas histórias de Benedito Ruy Barbosa poderia atrair novamente o público. 

Renascer foi um grande sucesso em 1993. Com uma primeira fase memorável e sem falhas, algo característico nas tramas de Benedito, a novela, que transportava os telespectadores ao sertão da Bahia e ao universo das fazendas de cacau, fez história. No entanto, a memória do público sobre a novela focava, em sua maioria, na primeira fase. Nas redes sociais, as cenas e os personagens dessa fase eram os mais lembrados. Poucos, porém, destacavam que a novela original já enfrentara problemas em sua segunda fase, que foi considerada arrastada e cheia de complicações — outra característica comum nas histórias de Benedito. O mesmo se repetiu no remake.

A nova versão, assinada por Bruno Luperi, neto de Benedito, trouxe uma primeira fase capaz de emocionar o público mais uma vez. Porém, na segunda, a audiência começou a minguar, afastando quem havia se entusiasmado com o início da história de José Inocêncio e Maria Santa.

Ao contrário de Pantanal, em que Luperi foi criticado por apenas copiar os capítulos do avô, a versão de 2024 de Renascer trouxe diversas alterações. A trama de 1993 já não caberia na nova Globo, sendo repleta de temas datados que não condizem mais com o posicionamento atual da emissora perante à sociedade. Luperi foi além, atualizando não apenas questões como transfobia e racismo, mas também ampliando discussões, especialmente sobre o sincretismo religioso, elemento forte na cultura baiana. Essas mudanças resultaram em cenas belíssimas e memoráveis, com destaque para a atuação de Edvana Carvalho, cuja personagem Inácia trouxe falas impactantes.

O remake de Renascer em 2024 também contou com uma direção menos convencional para o formato de telenovela. Gustavo Fernandez não cedeu às críticas e optou por uma segunda fase híbrida, mesclando elementos de novela, série e cinema. No elenco, alguns nomes se destacaram. Na primeira fase, Humberto Carrão, Duda Santos, Antonio Calloni, Juliana Paes e Enrique Díaz corresponderam às expectativas de quem havia assistido à versão original. Já na segunda fase, além de Edvana Carvalho, Sophie Charlotte e Juan Paiva se destacaram como pontos fora da curva em um elenco de alto nível.

Embora a imprensa especializada em televisão especule sobre a repercussão interna do remake na Globo, Renascer não pode ser considerado um fracasso, mas também está longe de ser um sucesso estrondoso. A culpa não é da novela de 1993, tampouco da de 2024, nem de Bruno Luperi ou de Benedito Ruy Barbosa. E o público também não tem culpa. Talvez a direção artística da emissora precise alinhar melhor suas escolhas com o momento do país. Se o Brasil, recém-saído de uma pandemia, ansiava por uma boa novela e fez de Pantanal um fenômeno em 2022, o Brasil de 2024 parecia não estar disposto a se render à simplicidade de Renascer. A telenovela, assim como o facão de José Inocêncio fincado no pé de Jequitibá Rei, continua cravada no coração dos brasileiros, à espera de boas histórias, sejam elas originais ou recontadas.


Pablo Brito

Jornalismo na UFSC e na vida. Escrevo até esse ofício ficar mais cada vez mais complicado de ser praticado.

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