Isabelle Fudal e Rafaela Azevedo

Espiar por uma pequena abertura de uma caixa cênica e descobrir um novo mundo por meio de uma performance artística imersiva são experiências proporcionadas pelo Coletivo Autônomo Lambeiro Ixpia. O grupo, formado no final do ano passado por participantes do curso de Formação Inicial em Teatro de Animação (FINTA) do Instituto Federal de Santa Catarina (IFSC), realiza apresentações de Teatro Lambe-Lambe em Florianópolis. Em suas peças, eles exploram temas variados, como memória, afeto, questões ambientais e lendas fictícias.
Caracterizado por espetáculos curtos, de dois a quatro minutos, em caixas portáteis confeccionadas com diferentes materiais, o Teatro Lambe-Lambe é uma invenção brasileira que celebra 35 anos em 2024. Essa vertente do Teatro de Animação foi criada em 1989 pelas artistas e educadoras nordestinas Denise di Santos e Ismine Lima. O nome remete aos antigos fotógrafos de rua, os quais usavam câmeras em forma de caixa e revelavam fotos ao “lamber” o negativo.
Alex de Souza,
professor de Teatro no IFSC e integrante do Ixpia
É importante que as pessoas no Brasil saibam que é uma criação nossa, que está pelo mundo e que é tão relevante como qualquer outra modalidade.
Objetos, sombras, cartas, máscaras e bonecos são alguns dos recursos utilizados nas performances pelos artistas, conhecidos como “lambe-lambeiros”. Além disso, há a possibilidade de incluir música e figurinos. “Tem vários tipos de caixa. Caixas que tem texto, fala, música, caixas que não tem nada”, explica Jerusa Mary, atriz e integrante do Ixpia. A combinação desses elementos oferece aos espectadores uma imersão no universo das narrativas, o que torna a experiência mais rica e envolvente.


Produzida durante o FINTA, a caixa de Jerusa é feita de papelão e conta a história do zumbi Cassius. A inspiração para a construção da narrativa veio da maneira como as pessoas vivenciam o presente. “No nosso dia a dia, ficamos muito imersos no nosso mundo, grudados no celular. Muitas vezes, a gente existe mas não vive, igual a um zumbi — ele existe mas não está vivo”, afirma.

Ao longo da performance, o zumbi Cassius conhece a leitura. “Quando esse zumbi encontra o livro e decide ler, as coisas começam a ganhar cor ao redor dele. Ele abriu um livro e se permitiu ler e quando fechou, o mundo ficou cinza de novo”, conta Jerusa. De acordo com a atriz, o conto gera diferentes interpretações dos espectadores.
Jerusa Mary,
atriz e integrante do Ixpia
Tem gente que se emociona, tem gente que não entende nada.
Conhecida como 410, a caixa de madeira criada pela atriz e professora de teatro Franciele Garcia convida os espectadores a reviver memórias de infância. Através da encenação de seu antigo lar, Franciele explora a nostalgia e a conexão com o passado. “Queria muito pensar na memória e gostei de trabalhar com essa ideia do público ter a experiência de me enxergar como se fosse brincando com essas memórias, quase igual quando a gente brinca com uma casinha de boneca”, relembra o processo criativo.

“Aquele lugar de suspiro que nos reconecta com o nosso interior”: é assim que a Franciele descreve o Teatro Lambe-Lambe e o trabalho do Ixpia. Para ela, participar ou assistir a um espetáculo nesse formato é uma maneira de desacelerar o ritmo frenético do cotidiano. “São três minutos em que nos permitimos mergulhar em uma história fantástica, em um universo de fantasia que, de alguma forma, se comunica poeticamente com cada um de nós.”, reflete.
Para vivenciar esse universo e disseminar a arte do Teatro Lambe-Lambe, o Coletivo Ixpia realizará sua próxima apresentação no dia 23 de novembro, das 11h às 13h, no Museu de Florianópolis.
Publicado no portal Se Liga, Mané! em 10/11/24
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